domingo, março 11, 2007

Visitantes de corações

Existem alguns seres que chamo de visitantes de corações.
Eles espreitam os corações dos outros pra ver se tudo está certo.
Caso contrário, eles se preocupam e tentam botar as coisas em ordem.
Eu tenho alguns destes seres em minha vida.
Bom, um deles se chama Gilmar Brito.
Uma coisa importante de ser dita
é que estes seres têm uma forte ligação com os donos dos corações visitados.
Assim, Gilmar tem uma forte ligação comigo.
Uma ligação quase que telepática.
Não houve em minha vida, desde que conheci Gil,
um momento de angústia em que ele não aparecesse de uma maneira ou de outra.
Não nos vemos com freqüência, mas sempre mantemos contato seja por telefone, internet ou até sinal de fumaça.
Gilmar quase foi de fato da família.
Meu quase namorado, ex-cunhado e eternamente amigo.
Não compreende muito de minha loucura, mas a respeita e até deve achar engraçada.
Não fosse assim, não teria me suportado tanto tempo.
São quase 10 anos de amizade... muito tempo, né Gil?!
É meu anjo da guarda. Meu fiel escudeiro.
E se minha alma salva... ele mantém meu arrebatamento prisioneiro.
O que eu não faria por ele???
Pouca coisa... Gilmar está sempre a visitar meu coração, embora, talvez ainda não saiba,
que nesse meu órgão palpitante ele tenha morada certa.
Vem, espreita, vê se está tudo onde deveria estar.
Se sim, vai embora. Se não, fica, me diz que tudo tem solução, que é preciso ter fé no mundo,
que é preciso ter fé em mim e só se vai até tudo voltar ao seu devido lugar.
Gilmar é deveras um visitante assíduo... Gilmar está sempre a me guardar.

Histórias...

Eu quero contar histórias para fazer as crianças sonharem
Os idosos relembrarem
E os rostos sorrirem
Quero provocar saudades
Fazer vislumbrar amores
Fazer sentir odores de manhãs primaveris
Quero contar histórias remetendo às coisas belas
Pintar as aquarelas de sonhos por todos sonhados
Em frases tirar retratos pra deixar registrada
Na memória da poesia
Cousas de mais valia
Provocando nostalgia
Da beleza vista por mim
Eu quero contar histórias
Que faça o céu ficar mais claro
A água ficar mais fresca
O ar mais perfumado
Como aquele abraço dado num
Aconchego sem ter fim
Quero contar histórias
Para fecharmos os olhos
E sentirmos o cheiro de terra molhada
Como num percorrer de estrada ao viajarmos de "manhãzim"
Que todas as minhas histórias contemplem
A ancestralidade de nossos avós
As coisas bonitas da terra
Acabando com as querelas
E cultivando o melhor de nós

domingo, março 04, 2007

A humanidade ainda tem salvação...

Não é todo dia que a gente encontra
Alguém que de fato te corresponda
Em todos os sentidos
E se comigo assim ele se porta
É porque eu o completo naquilo que importa
E assim seguimos entendidos...

Se nos teus olhos eu vi os meus
E em tua boca o meu sorriso
Creio que mais que isso já é
Mais do que pedi a Deus

Não há felicidade maior
Nem maior paz de espírito
Do que alcançar o que
Sempre me pareceu mito
Um carinho assim como o que você me deu...

Já amei algumas vezes
E algumas vezes também sonhei
E projetei planos futuros
Mas é duro constatar que a calma,
A paixão, a volúpia e os sussurros,
Até então nunca foram tão puros
Tão intensos... A vida já não será mais a mesma
E a única certeza que tenho é que sou tua
Tua... E a memória somente existe pra relembrar a mais bela experiência
Inventada pela humanidade... Constato isso e creio que temos ainda salvação.

Dona Maria Oliva

Ela não poderia ter nascido numa outra data qualquer. Nasceu na data dos enamorados: 12 de junho. E se tornou de fato enamorada no momento em que viu o meu avô. Talvez eu esteja romantizando demais a história dos dois, mas acho que eles gostariam que eu contasse assim. Ambos eram “experts” em dar magia às histórias e adorávamos isso, por mais que aumentassem e floreassem.

Se minha avó passou sua vida na pobreza, era rica de espírito e nunca deixou seus filhos passarem fome. Plantava hortaliças e árvores frutíferas no seu quintal. Um quintal que quando criança eu via enorme e achava que poderia alimentar infinitamente. Tinha esta impressão porque de fato alimentava os nossos olhos de tão viçoso e de tão grande que era nossa família. Minha avó era rica em filhos e em amor. De manhã cedo ela fazia café para os garis da rua. Dava um pão com manteiga a cada um. Todos sentavam na calçada e tomavam café contando casos e cousas. Assim, ela se interava das histórias da cidade. Era praticamente seu jornal matinal. Junto com as filhas mais velhas, olhava por todos os pequenos. Zelar para que todos tivessem tomado café e banho. Depois disto, cuidar da casa, do almoço e vender os gêneros na feira. Trocar o excedente pelo que não poderia cultivar em casa e eis o milagre da multiplicação. Os rapazes iam caçar pra complementar a refeição. Acho que alguns dos guris não eram tão ligeiros e caçavam jabutis (se é que isso pode ser chamado de caça...). Quantas vezes meu pai não me falou de quando ele ia pegar jabuti debaixo do juazeiro (fazendo referência que havia tanto jabutis que eles pegavam despreocupadamente achando que nunca iriam acabar).

Não tenho dúvidas que a vida da minha avó não era fácil. Mas não tenho dúvidas do respeito que todos aqueles que tiveram a chance de conhecê-la sentiam por ela e do amor que seus filhos lhe dedicaram. Rezadeira, cuidava da espiritualidade de seu povo. Rezou muitos meninos e meninas. Lembro inclusive de quando ela ia me rezar. Me botava sentada numa cadeira em seu quintal, pegava um ramo de uma planta que hoje não reconheço mais e se punha a fazer o sinal da cruz a minha frente. Falava baixo e rápido. Não entendia nada que ela dizia, mas ela franzia a testa e eu via tanta fé no apertar de seus olhos que acreditava que depois daquilo poderia brincar em paz, fazer qualquer arte. Nada ia me acontecer. Bom, pelo menos nunca aconteceu... mas também nunca brinquei de super-girl para pular de nenhum prédio.

Minha avó não tinha dinheiro para comprar brinquedos para os netos, então costurava bonecas de panos para as meninas e fazia carrinhos de lata de óleo para os meninos. Às vezes também fazia uma boneca com as folhas de uma planta que tinha no quintal. O ramo tinha folhas opostas, então duas opostas eram os braços e outras duas opostas eram as pernas. A folha ímpar e terminal era a cabeça. Hoje quando lembro disso penso o quanto ela nos fazia usar nossa imaginação. Nossa fábrica de bolos de lama retirada de seu quintal era uma das coisas que fazíamos que a deixava de cabelo em pé... eu e minhas primas cheias de terra preta e prestes a pegarmos uma micose. Ela sempre foi forte, acho que sempre deve ter sido muito paciente, sempre amou meu avô e sempre, de uma maneira ou de outra, cuidou dos seus.
Se existir vida após a morte, minha avó, Dona Maria Oliva, foi encontrar meu avô na sexta-feira (dia 23/02). Seu enterro ocorreu sob uma fina garoa e leve cheiro de terra molhada. Havia em todos os presentes, acima de tudo, um sentimento certeiro de que ela havia cumprido sua missão na terra.